Maria Carmem Barbosa
3. CAMINHOS PARA A CONSTITUIÇÃO DE PEDAGOGIA(S) ESPECÍFICA(S) PARA OS BEBÊS
As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil apresentam, e defendem uma concepção de sociedade, de educação e de infância que será adotada pelos sistemas educacionais na orientação das políticas públicas de educação infantil, porém elas precisam também estar presentes como fundamentação da organização do cotidiano das escolas infantis. Os serviços de educação infantil podem, a partir das concepções presentes nas diretrizes, revisar e reelaborar seus planejamentos e avaliar suas propostas pedagógicas e curriculares.As diretrizes apresentam a escola de educação infantil como um espaço educacional que tem o importante papel de compartilhar, de forma indissociável, a educação e cuidado das crianças pequenas com suas famílias. Essa é uma característica essencial deste tipo de instituição e a distingue de outros tipos de estabelecimentos e níveis educacionais. Como vimos anteriormente, a escola de educação infantil vem, cada vez mais, ocupando o lugar da família ampliada especialmente nos grandes centros urbanos. Isto é, ela oferece aos pais e responsáveis pelos bebês parceiros que complementam a atenção, o cuidado e a educação dos bebês e também um espaço para o encontro e a interlocução com pessoas qualificadas para dialogar sobre a educação das crianças pequenas. As famílias não podem ser vistas apenas como usuárias de um serviço, mas como colaboradoras, isto é, co-autoras do processo educacional, pois é preciso sintonia quando se trata de educar uma criança pequena ou um bebê.
Educar bebês na vida coletiva da escola
As crianças ao nascerem se defrontam com um mundo que está em processo contínuo de constituição. Para receber estas crianças, os adultos responsáveis selecionam de seu patrimônio afetivo, social e cultural as práticas de cuidado e educação que consideram mais adequadas para oferecer bem-estar a estes bebês e para educá-los.
Porém esta não é uma tarefa simples mesmo os responsáveis, isto é os pais das crianças, provêm de mundos sociais diversos e necessitam de muito diálogo para estabelecer parâmetros para a educação de seus filhos. Cada família tem um modo de alimentar, embalar, acariciar, brincar, tranquilizar ou higienizar as crianças. E estas ações podem ser realizadas de diversas formas, afinal as diferentes culturas inventaram múltiplos modos de criar suas crianças pequenas. E cada família tem um modo específico para compreender o choro de uma criança, suas necessidades de alimentação e de brincadeira e fazer suas escolhas tendo em vista as tradições familiares ou concepções aprendidas com diferentes interlocutores.
A escola precisa estabelecer uma relação efetiva com as famílias, e a comunidade local, para conhecer e considerar, de modo crítico e reflexivo, os saberes, as crenças, os valores e a diversidade de práticas sociais e culturais que cada grupo social tem para criar seus bebês. Um bebê ao ingressar numa turma de berçário vai ampliar seu universo pessoal ao conectar-se com universos familiares bastante diferenciados.
Obviamente a escola, apesar de seu relacionamento com a comunidade e com as famílias, terá estratégias educativas diferenciadas, pois ela precisa atender as crianças na perspectiva da vida coletiva e não do atendimento individual como acontece nos lares.
A escola, com a participação dos pais, organiza em seu projeto político e pedagógico, um modo de conceber a educação das crianças pequenas e oferecer práticas de vida coletiva, sem se descuidar das singularidades de cada família, de cada bebê e de cada profissional. Na escola de educação infantil, espaço público de educação coletiva, as práticas de cuidado e educação de bebês tornam-se um importante campo de estudos, debates e tomada de decisões que necessitam estar contemplados nos projetos pedagógicos.
O Projeto Político-Pedagógico é o resultado de um trabalho conjunto entre profissionais e famílias, um trabalho de reflexão, debate e confronto. Nele, a partir de princípios legais, um grupo de gestores, pais, funcionários e professores selecionam e explicitam os princípios educacionais que auxiliam aos pais e educadores a pensar sobre o seu agir, isto é, a constituir referências e a compartilhar ações.
Um currículo para os bebês
Para os bebês, a ida para a creche significa a ampliação dos contatos com o mundo, para os adultos, responsáveis pela educação das crianças na creche, significa selecionar, refletir e organizar a vida na escola com práticas sociais que evidenciem os modos como os professores compreendem o patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico e os modos como traduzem, no exercício da docência, as suas propostas pedagógicas.
As práticas sociais que as famílias e a escola ensinam para os bebês e as crianças bem pequenas são as primeiras aprendizagens das crianças e constituem o repertório inicial sobre o qual será continuamente constituída a identidade pessoal e as novas aprendizagens das crianças. Por exemplo, os bebês aprendem a se vestir sendo agasalhados pelos adultos, aos poucos, os pequenos iniciam um processo de participação na ação de vestir-se e, finalmente, eles vão aprendendo a vestir sozinho suas roupas, até mesmo a escolher e demonstrar suas preferências. Esses conhecimentos sociais e culturais apesar de pouco valorizados nas escolas de educação infantil são extremamente importantes para a constituição das crianças, dos seus hábitos, dos modos de proceder, das suas relações e das construções sociocognitivas.
Essas práticas sociais são estruturadas através de linguagens simbólicas com conteúdos culturais. Assim, as propostas pedagógicas dirigidas aos bebês devem ter como objetivo garantir às crianças acesso aos processos de apropriação, renovação e articulação de diferentes linguagens. É importante ter em vista que o currículo é vivenciado pelas crianças pequenas não apenas através de propostas de atividades dirigidas, mas principalmente através da imersão em experiências com pessoas e objetos, constituindo uma história, uma narrativa de vida, bem como na interação com diferentes linguagens, em situações contextualizadas, adquirindo, assim, o progressivo domínio das linguagens gestuais, verbais, plásticas, dramáticas, musicais e outras e suas formas específicas de expressão, de comunicação, de produção humana.
As concepções contemporâneas sobre os bebês, a infância, a aprendizagem e a educação encaminham para a compreensão de um currículo que vislumbre o desenvolvimento integral de crianças nas suas dimensões: expressivo-motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética, estética e sociocultural compreendendo as crianças em sua multiplicidade e indivisibilidade.
Porém, quando pensamos nas crianças bem pequenas, isto é, nos bebês temos dúvidas sobre como propor este currículo. Ora, não será certamente através de aulas, de exposições verbais, mas, como vimos anteriormente, a partir da criação de uma vida cotidiana com práticas sociais que possibilitem alargar horizontes, ampliar vivências em linguagens, para que os bebês experienciem seus saberes. Serão exatamente esses primeiros saberes, essas experiências vividas principalmente com o corpo, através das brincadeiras, na relação com os outros – adultos e crianças – que irão constituir as bases sobre as quais as crianças, mais tarde, irão sistematizar os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico.
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